quinta-feira, 2 de junho de 2011

O OUTRO


Sérgio Biagi Gregório

1. INTRODUÇÃO

A finalidade deste estudo é refletir sobre o relacionamento entre o nosso "eu" e os "eus" de outras pessoas. Pergunta-se: quem é o outro? Como distinguir o meu "eu" do "eu" dos outros? Que tipo de "outro" estamos sendo para os "outros"?

2. CONCEITO

Outro – Do latim alteru (outro entre dois) significa diverso do primeiro, diferente de pessoa ou coisa especificada. Para Sartre, "o outro é o eu que não sou eu". A qualidade das relações que o homem trava com o outro depende não apenas da simpatia de que é investida, mas também, do conhecimento recíproco dos protagonistas.

3. PALAVRAS INICIAIS

Desde o início da filosofia o problema do outro e do diverso esteve em destaque. O pensamento de Parmênides era o pensamento do Mesmo (identificado com o Ser), o de Heráclito parece ter sido o do Outro. Platão introduziu o Não-ser sob a forma de o Outro. Na filosofia moderna e contemporânea, o problema do outro indica o problema da existência de outros eus (espíritos ou pessoas), independentes do eu que formula o problema. Presentemente, as Universidades e escolas de ensino médio dos EUA incluem em seus currículos uma disciplina que ensina os alunos a se relacionarem melhor, especificamente o relacionamento entre casais. Em termos científicos, há comprovação de que o sofrimento de pessoas queridas pode realmente nos atingir. Para isso, aUniversity College London, na Inglaterra, avaliou 16 casais, utilizando uma máquina de ressonância magnética e eletrodos.

4. ALGUMAS POSIÇÕES FILOSÓFICAS

4.1. LEVINAS É FILÓSOFO DA "ALTERIDADE".

Reflete em torno do "Outro". Para ele, o Outro não é o distante, o estranho, e muito menos o impessoal. O Outro é universo epifânico e dialogal. O milagre consiste em que um homem possa ter sentido para outro homem. E valoriza a presença do Outro. Levinas estabelece a relação entre ética e ontologia. "Ser-Outro é mandamento, é apelo à responsabilidade. É minha responsabilidade perante a face que me olha. (Arduini, 2002, cap. VIII)

4.2. A CONSPIRAÇÃO DE TEILHARD DE CHARDIN

Conspirar é aspirar com os outros. É formar constelação de agentes em torno de uma causa. Teilhard de Chardin salienta que "conspiração é a aptidão de diversas consciências que se juntam para construir um Todo, onde cada pessoa tem consciência de sua participação como todos os outros... Conspiração de unidades pensantes. É imperioso tecer a rede de solidariedade mundializada. (Arduini, 2002, cap. VIII)

4.3. FICHTE E O DEVER

Fichte, em Doutrina Moral (1798), afirma o caráter originário da idéia do dever, da qual deriva o reconhecimento dos outros eus. A idéia do dever é a autodeterminação originaria do eu, mas ela não poderia ser realizada se não existissem outros eus, outros sujeitos em face dos quais, somente, a idéia do dever pode ter a sua determinação e, portanto, possibilidade de realização.

5. SOLIDARIEDADE

5.1. QUEM É O OUTRO?

O outro retrata a Humanidade, no que ela tem de bom ou de ruim.

Aspectos negativos: o "outro" ocluso é hermético, o "outro" desconhecido é distante, o "outro" ameaçador inspira desconfiança, o "outro" prepotente esmaga os subalternos, o "outro" violento é agressivo, o "outro" egocêntrico encastela-se em seus próprios interesses, o "outro" constrangedor coage a liberdade e bloqueia a comunicação, o "outro" rejeitado é discriminado, o "outro" insensível não se abala com a pobreza alheia, o "outro" traiçoeiro derruba parceiros, o "outro" cínico engana a sociedade.

Aspectos positivos: o "outro" diferente revitaliza a sociedade, o "outro" companheiro caminha conosco por estradas planas e esburacadas, o "outro" solidário é pessoa com quem se pode contar nas horas de alegria e de tristeza, o "outro" aliado assume as causas legítimas da justiça, o "outro" movido pela esperança avança sempre, o "outro" audacioso suscita coragem, o "outro" honesto não se vende por bagatelas, o "outro" autêntico é reserva de humanismo, o "outro" fraterno é habitado pela caridade transparente. (Arduini, 2002, cap. VIII)

5.2. NARCISISMO

Narciso vem do grego "Nárkissos". Indica torpor, é "Narco". Daí o "narcótico". Conta o mito que Narciso era filho do rio Cesifo e da ninfa Liríope. Narciso não correspondeu ao amor de Eco. Por isso, Afrodite condena-o a mirar-se nas águas. Debruça-se sobre o rio e fica encantado com sua beleza refletida na água. Acaba enamorando-se de si mesmo.

Narciso amava a si mesmo e desprezava o amor dos outros. Narciso sobrevive na mentalidade e nas atitudes das sociedades. Há setores que estimulam o individualismo psicológico, econômico e social. (Arduini, 2002, cap. VIII)

5.3. A RESPONSABILIDADE

Cada pessoa tem a responsabilidade de ser caminho para os outros. É injusto excluir outros do caminho. Pergunta-se: estamos criando condições de potencializar o nosso próximo? Predispomo-nos a ouvi-lo com atenção? E se for um homem iletrado? Temos para com ele o respeito de um ser humano?

A responsabilidade não diz respeito somente ao ser humano, mas também em relação ao meio ambiente. Hoje, são muitas as empresas que se preocupam com o que produzem, com o tipo de lixo que estão descartando, com as condições de trabalho de seus funcionários etc.

6. REFLEXÃO EM TORNO DO EVANGELHO

6.1. PARÁBOLA DO BOM SAMARITANO

É um paradigma para o estudo da caridade. Nela, um homem que descia de Jerusalém para Jericó, caiu nas mãos de ladrões que o despojaram, cobriram-no de feridas e se foram, deixando-o semimorto. Passaram pelo mesmo caminho um sacerdote, um levita e um Samaritano. Os dois primeiros desviaram-se do homem enfermo; o Samaritano, porém, foi tocado de compaixão, pensou-lhes as feridas e o conduziu a uma hospedaria. Nesta passagem, Jesus quis nos mostrar que a prática da caridade não está atrelada a religião, mas pertence ao íntimo do ser, pois o Samaritano, que era considerado herege mostrou-se mais caridoso do que aqueles que tinham o conhecimento da religião organizada.

6.2. FAZER AO OUTRO O QUE GOSTARÍAMOS QUE NOS FIZESSE

Esta frase tem cunho de uma ordem. Ela está ligada a uma outra que diz: "Amai ao próximo como a si mesmo". Quer dizer, o outro é o nosso próximo e o próximo mais próximo é o nosso familiar, aquele que convive conosco, sob o nosso teto. Caso vivamos sozinhos, o nosso próximo passa a ser o que convive conosco no trabalho, na empresa, ou na igreja que freqüentamos. De modo que em toda a ocasião de nos relacionarmos com o próximo, podemos por em pratica esses ensinamentos. É preciso, pois, penetrar na sua profundidade, ou seja, dar ao outro o que ele precisa e não aquilo que nos sobra, que está nos atrapalhando. É o caso de desfazermos de alguns bens para o auxilio ao próximo. Damos coisas sujas, roupas que não terão mais uso, roupas que deverão ir para o lixo.

6.3. O PROBLEMA DIFÍCIL

O mais intricado problema do mundo é o de cada homem cuidar dos próprios negócios, sem intrometer-se nas atividades alheias.

Para ilustrar esta tese, o Espírito Néio Lúcio conta a história de um sábio e as ordens dadas aos seus três filhos, em razão da discussão sobre o problema mais difícil para alcançar o progresso espiritual. O pai, para tornar prático o ensinamento, propõe-lhes a tarefa de levar algumas dádivas ao palácio do príncipe governante: o primeiro seria o portador de rico vaso de argila preciosa; o segundo levaria uma corça rara; o terceiro transportaria um bolo primoroso da família.

No caminho, cada irmão ficou preocupado com a tarefa do outro. Assim, O que carregava a corça, preocupado com o condutor do vaso, descuida da própria tarefa e tenta ajudar a posição do vaso. Com isso, o vaso cai e quebra-se. Com o choque, o condutor da corça perde o controle do animal, que foge espantado. O carregador de bolo avança para sustar-lhe a fuga, internando-se no mato e o bolo espatifa-se no chão.

Desapontados, voltam à casa materna sem terem cumprido a obrigação. O sábio disse-lhes: se cada um de vocês estivesse vigilante na própria tarefa, não colheriam as sombras do fracasso. (Xavier, 1966, cap. 36)

7. CONCLUSÃO

O eu não existe sem o outro. Tudo o que fazemos, por mais insignificante que seja, é sempre direcionado ao outro. Mesmo o maior dos egoístas, quando desencarna a sua riqueza a sua herança vai para as mãos de seus descendentes.


8. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ARDUINI, Juvenal. Antropologia: Ousar para Reinventar a Humanidade. São Paulo: Paulus, 2002. (Coleção estudos antropológicos)

XAVIER, F. C. Jesus no Lar, pelo Espírito Néio Lúcio. 5. ed. Rio de Janeiro: FEB, 1966.

São Paulo, junho de 2005


texto - http://www.ceismael.com.br/filosofia

imagem - despertandonaluz.blogspot.com

Um comentário:

Jorge Nectan disse...

Somos todos irmãos, pois filhos de Deus. Assim, tudo que realizamos há de repercutir no nosso irmão. Não há como viver sem as pessoas. Como vamos crescer? Sozinhos? Mesmo porque quem nos ensina são sempre as pessoas. Os testes também.
Respeitemos o outro como gostaríamos que nos respeitassem.

Um abraço!!

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